A transparência das Câmaras Legislativas dos municípios brasileiros

(Estudo elaborado por membros do Conselho de Cidadãos, em agosto de 2016)

A prestação de contas e a transparência são elementos fundamentais em relações em que uma pessoa delega a outrem a gerência de coisa ou recursos que lhe pertencem, individual ou coletivamente. A relação entre o eleitor e o poder público é uma das que são regidas por tais elementos, ou seja, esses são princípios da condução da coisa pública. Contudo, nem sempre os princípios, ainda quando por força normativa (veja-se a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei de Acesso à Informação, por exemplo), são devidamente seguidos e, nesse sentido, não é incomum situações em que o gasto público torna-se uma verdadeira “caixa preta”.

Considerando isso e a proximidade das eleições municipais, um grupo, composto por profissionais de várias áreas de formação, que está criando o Conselho de Cidadãos, um modelo de mobilização social para combater a corrupção (para saber mais sobre, veja mais no site: www.conselhodecidadaos.com.br e nas outras mídias sociais do movimento – @cdecidadaos), decidiu investigar o nível de transparência das Casas Legislativas de trinta dos principais municípios brasileiros. Para tanto, a investigação ocorreu através da verificação, nos sítios na internet das respectivas Câmaras de informações relativas ao acesso aos seguintes itens:

  • Ao link do portal da transparência na página principal (10).
  • À lista com os nomes dos assessores dos vereadores (15).
  • À lotação dos assessores (nome do vereador a quem eles estão vinculados) (25).
  • Aos valores da remuneração dos assessores dos vereadores (30).
  • Aos gastos de cada vereador (combustível, correios, aluguel de carros, cerimonial, alimentação etc.) (20).

As pessoas que fizeram a pesquisa não detêm conhecimento específico para a verificação dos dados, tendo agido como a média da população brasileira, no seu nível de escolaridade (adiante indicado), agiria. Eles deveriam acessar o portal de cada Câmara e responder se encontraram cada informação acima relacionada e, quando encontrada, se foi “fácil”, “médio” ou “difícil” encontrar. Quanto aos elementos acima, definiu-se para fins de escalonamento dos resultados, quais informações seriam mais importantes, atribuindo-se pesos. O número entre parênteses, apresentado ao lado de cada elemento, indica tal ordem de importância, sendo “30” o mais importante e “10” o menos.

Há que se dizer que o tempo gasto nessa investigação girava entre uma e duas horas, o que é um limitador no processo de obtenção de respostas. Considerando isso, no período entre 17 de junho e 01 de julho de 2016, quinze cidadãos fizeram a pesquisa, sendo um com nível médio, dois com nível superior incompleto, dois com nível superior completo e os dez restantes com pós-graduação completa. Esse público é formado por profissionais da área do direito (em sua maioria), de contabilidade, de marketing, da área acadêmica etc. Essas características permitem afirmar que a amostra é formada por um público bastante qualificado.

Considerando o número de respondentes, assim como os demais fatores aqui expostos, as informações adiante apresentadas são as impressões desses sujeitos, não podendo ser generalizadas nem recebidas com valor científico. Ainda assim, cumpre destacar a importância dessas impressões para a reflexão dos cidadãos em geral e dos agentes políticos sobre as responsabilidades de ambos no processo de controle e quanto à garantia da transparência. Por exemplo, por meio do acesso às informações analisadas nesse levantamento, um dos respondentes constatou (e questionou) o fato de um dos vereadores de Rio Branco (AC) ter recebido um salário maior do que o dos demais.

As câmaras legislativas analisadas foram as das 27 capitais brasileiras e mais três municípios escolhidos aleatoriamente (Feira de Santana e Vitória da Conquista, os dois maiores do Estado da Bahia; e Guarulhos, o maior do interior do Estado de São Paulo). Com base nos apontamentos dos cidadãos consultados, foram escolhidas as Câmaras com os melhores e os piores desempenhos. Antes, porém, de apresentar esses resultados, cumpre apresentar alguns achados gerais do processo.

Em geral, foi verificado que não há um padrão quanto ao nome adotado para o canal em que as informações são disponibilizadas, tendo algumas delas tratado como “Portal da Transparência”, outras como “Transparência”, ou ainda como “Acesso à Informação”. Também não há padrão quanto aos conteúdos e formatos em que as informações são disponibilizadas. Algumas das Câmaras (por exemplo, Belo Horizonte/MG, Curitiba/PR, João Pessoa/PB, Maceió/AL, Natal/RN, e Vitória da Conquista/BA) exigiam informações pessoais, como o CPF do consulente, para que algumas informações fossem disponibilizadas, o que é um elemento dificultador da pesquisa, que pode criar constrangimentos ou receios aos consulentes. O site da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, segundo relatado por quatro respondentes, estava fora do ar, um destaque negativo. Dois respondentes relataram o mesmo para a Câmara de Fortaleza/CE, outro para a de Vitória da Conquista/BA, mesma situação de Belém/PA.

Num exemplo intermediário de desempenho quanto à disponibilização dos dados, a Câmara do Distrito Federal disponibiliza em uma tabela, “Quadro Demonstrativo de Pessoal”, com informações como nome do servidor, cargo, remuneração e, em uma das colunas, a informação da “Lotação”, com alguns códigos específicos, os quais não são possíveis de se identificar a que se referem. Indicar o nome do Deputado Distrital, e não código, faria dessa tabela um bom exemplo de divulgação.

Ainda numa análise geral, houve relatos sobre a apresentação de dados desatualizados. Outra situação apontada comumente pelos respondentes é sobre a necessidade de se clicar em vários links até que se consiga encontrar as informações procuradas, o que dificulta o acesso às mesmas. Há também situações em que os links disponíveis não funcionam, não dão acesso a informações e outras em que é disponibilizada a lista dos cargos comissionados, mas sem a especificação de suas funções ou a qual vereador o servidor está vinculado. Em relação aos outros gastos dos vereadores, poucas câmaras publicam todos os gastos por vereador, algumas apresentam apenas sobre as diárias e a grande maioria nada informa a respeito, pelo menos de forma alocada por vereador.

Impõe-se registrar que a pesquisa não busca investigar se, de fato, as informações são possíveis de serem alcançadas, mas sim qual o nível de transparência dos portais das câmaras municipais, sendo a facilidade de acesso um dos critérios para a pontuação no ranking.

Feitas essas considerações qualitativas mais gerais, a partir das observações indicadas pelos respondentes no questionário, passemos à apresentação dos piores e dos melhores resultados quanto à transparência. Para escolha dos mesmos, o seguinte critério foi adotado. Considerou-se o número de “sim” obtido para cada resposta, para encontrar o percentual de “disponibilização” de cada um dos dados. Por exemplo, a Câmara Municipal de Salvador, na Bahia, recebeu 15 indicações de “sim” quanto ao “Acesso ao link do portal da transparência na página principal”, ou seja, 100% dos respondentes indicaram o acesso ao referido link. Quanto “Acesso à lotação dos assessores (nome do vereador a quem eles estão vinculados)”, 5 respondentes afirmaram encontrar tal dado, ou seja, apenas 33%, aproximadamente. Tais percentuais foram multiplicados pelos respectivos pesos, encontrando o resultado para cada elemento. Da soma desses resultados, dividindo-a posteriormente por 10, foi possível encontrar a nota de cada câmara, que poderia variar numa escala de 0 a 10. Para fins apenas ilustrativos, apresentam-se abaixo os dados e cálculos para a Câmara de Salvador/BA:

A Câmara Municipal de Salvador obteve, segundo as impressões dos 15 respondentes e os critérios aqui estabelecidos, a nota 3,73. Prejudica o desempenho, como demonstrado na tabela, o fato de não ser disponibilizada a informação sobre a lotação dos assessores (a qual vereador cada assessor estaria vinculado).

Considerando tais critérios para o estabelecimento das notas, no escalonamento, os cinco piores desempenhos entre os municípios analisados foram nas câmaras de Guarulhos/SP (nota 1,67), João Pessoa/PB (1,43), Macapá/AP (1,40), Vitória da Conquista/BA (1,13) e São Luís/MA (1,13). Para dar uma ideia de posicionamento desses números quanto ao desempenho geral (o “Ranking” completo segue abaixo), a Câmara de Salvador, com os dados apresentados na tabela acima, ficou na 16ª posição com a nota de 3,73.

Nos destaques positivos, a câmara de Teresina/PI foi a que obteve o melhor desempenho, com a nota 7,77. Na sequência, aparecem Porto Alegre/RS (7,17), Palmas/TO (6,57), São Paulo/SP (6,50) e Boa Vista/RR (6,17). Há de se notar que até mesmo as que obtiveram uma avaliação positiva não apresentam um resultado excelente (uma nota máxima 7,77 está longe disso). Considerando a análise qualitativa das respostas de todos os consultados, em que alguns apontam o acesso a todos os dados, é possível inferir que o desempenho das Câmaras é diminuído em função de o acesso a alguns dos dados ser dificultado pelos fatores já expostos acima, por exemplo, a necessidade de apor dados pessoais, a necessidade de clicar em vários links até se chegar ao objetivo desejado, enfim. A informação pode estar disponível em certas circunstâncias, mas a forma como é feita acaba fazendo com que o cidadão, por vezes, não consiga alcançá-la.

Nesse sentido, uma das intenções desse levantamento é sugerir um modelo mais adequado, entre os encontrados, para que medidas sejam adotadas, seja de forma voluntária pelas diversas câmaras ou em decorrência de determinação normativa, em direção à padronização no sentido de facilitar o acesso às informações aqui analisadas, que têm a sua divulgação como uma necessidade normativa e social.

Ainda a partir da análise qualitativa, entre os bons exemplos, destaca-se também o modelo adotado pela Câmara de Teresina/PI. A câmara da capital do Piauí apresenta de maneira clara as diárias, mas quanto aos gastos em geral dos vereadores destaca-se o modelo de Recife/PE, em que a informação aparece na página principal da Câmara, assim como no “Portal da Transparência” da mesma, e é detalhada por vereador e por tipo (melhor exemplo de apresentação). Assim sendo, quanto à divulgação dos elementos analisados nessa investigação, sugere-se como modelo a ser implementado por todas as câmaras municipais o de Teresina/PI, incorporando a esse a forma como são divulgados os outros gastos pela câmara de Recife/PE.

Tal levantamento e este relato, que se encerra com a sugestão de um modelo a ser seguido (e melhorado), é fruto da ação de cidadãos que, cientes da importância de uma cidadania ativa para o combate à corrupção, uniram-se para a criação do Conselho de Cidadãos, que desenvolverá ações desse tipo e outras que resultem em um país mais honesto e menos desigual. Tais ações, tendo o Conselho de Cidadãos à frente, têm apoio de diversos órgãos representantes da sociedade, tais como: Igrejas, Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – seccional Bahia; faculdades públicas e privadas, organizações do mercado e outras entidades representativas de cidadãos e do empresariado.

Muita coisa precisa ser feita, mas segue aqui um dos primeiros passos!

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